21 janeiro 2007

The BUG: (com)Pressão no Dancehall

"Previously I've just been attacking minds with my music... Now it's an all out sonic war on mind and body" . (Kevin Martin) .
(este blog foi temporariamente invadido por um... BUG !?)
...
Disseram ao Kevin, aqui em cima, que na "tugolândia" ainda quase ninguém ouviu falar dele, mas ele, como já ouviu falar da FARWARD (claro!), ligou aqui para a "redacção" a ver se lhe era dado "tempo d'antena". E conseguiu. Sim, porque aqui aceitam-se "cunhas" e "subornos" (alguns). Mas tudo "por cima da mesa".
.
Por isso, desta vez, vamos falar do produtor mais HARDCORE do Dancehall, a quem, pelos vistos, ninguém liga.
Sinal de que anda tudo a dormir... e de que maneira.
.
Comecemos pelo básico.
.
Kevin Martin mora em Alperton, subúrbio de Londres (perto de Wembley), mas cresceu em Weymouth, pequena cidade na costa sul de Inglaterra.
.
Nos tempos de adolescente (final dos anos 70/início dos anos 80), era "punque". O primeiro sonoro que o marcou a sério foi "Never mind the bollocks".
.
Dava-se também com "motards" e cromos do Heavy, daqueles que sacudiam piolhos ao som de Black Sabbath.
.
Outra coisa de que também se lembra, é de gostar de fazer... BAAAAAARUUUULHUUUUUUU!!!!!
.
Provavelmente, foi por isso que passou 10 anos em bandas e projectos (quase todos de curta duração), a debitar Noise industrial, Trash/Jazz ou Electrónica "esquizo-experimentalóide".
.
Já teve muitas identidades: foi God, Ice, Techno Animal, Sidewinder, entre mais meia dúzia pa'esquecer.
.
.
(ICE, projecto "industrial" com 2 álbuns de duração, formado por Justin Broadrick e Kevin Martin)
.
Nalgumas dessas bandas da década de 90, Martin teve a companhia de Justin Broadrick, guitarrista dos Napalm Death (por pouco tempo) e fundador dos Godflesh, com quem chegou a "martelar".
.
Outro dos "buracos" em que se meteu com Broadrick foi Curse of the Golden Vampire, projecto inicialmente em parceria com Alec Empire (dos Atari Teenage Riot).
.
Mas a (in)felicidade maior foi a de gravar um álbum dos God, no estúdio de Bill Laswell, com John Zorn a servir de "misturadora".
.
Foi este "freaky tricky" que o fez despertar para o Dub, como técnica de produção.
-
"John Zorn came to mix the God album with me at Bill Laswell's studio, and because there was such a large amount of information, he was just like: «why don't we just dub it out?».
It hadn't occurred to me at that point because a lot of people in the band were jazz musicians who were quite precious about their positions. But as soon as he said it, i was like «Of course!»"
-
Consta que a partir daí, o insecto nunca mais foi o mesmo.
.
As suas criações passaram a levar com um tratamento baseado nos mesmos elementos e técnicas que King Tubby e Lee Perry popularizaram nos anos 70.
.
Para Kevin, os ideais do Dub podem ser aplicados em diferentes áreas artísticas, tal como William Burroughs fez na Literatura, por exemplo.
-
"I like the idea of a chaotic editing process that can jump forward, backward, sideways, whatever"
-
Depois de conhecer John Zorn, e com ele o Dub,, Martin assume então a tempo inteiro, a sua nova faceta...
.
-
"I love what Dub does to music, the randomness, the chaos, the way songs are infinite as opposed to finite, open-ended as opposed to closed"
-
O primeiro trabalho com o novo disfarce foi "Tapping the Conversation", banda sonora alternativa ao filme "The Conversation" de Francis Ford Coppola, com a colaboração de DJ Vadim.
.
.
"Tapping the Conversation" LP - Wordsound 1997
.
Mas antes do Bug ver a "luz" (do dub), outras figurinhas tinham-lhe já aberto a pestana e as orelhas.
.
O célebre "radialista" John Peel, com quem se habituou a ouvir Reggae, foi uma delas. A primeira experiência auditiva nessa área teve-a aos 15 anos, quando o professor de um amigo lhes mostrou "Foggy Road" de Prince Far-I. Parece que bateu... e forte.
.
Os P.I.L. e Adrian Sherwood deixaram-lhe também marcas consideráveis.
.
Mas é no início dos anos 90, ao mudar-se para Londres, que se dá a maior "mutação", depois de assistir pela primeira vez a um DubReggae soundclash.
-
"I feel scarred for life by my first experience with soundsystems. I can still remeber vividly the first one I went to, which was in the east end of London. It was in a horrible warehouse and it was THE DISCIPLES and IRATION STEPPAS having a face off. There was no light apart from a bulb over each soundsystem, there were about 50 people there, no one clapped... all of which was completely new to me. I was coming from a Noise cum Punk cum free Jazz background and this was pretty radical - no stage show, no audience participation other than almost a complete homage or faith in the sound, and a total absorption in the frequencies. For me it was incredible. The sound basically massaged my internal organs for three hours and I've never recovered from that experience. So, I'd say, soundsystem totally affected my whole outlook. Not just in terms of the sound, but the obsessiveness with detail and the obsession with mutation. And all the chaotic entities at the heart of it, whether it be through effects units or just some of the characters that work within Dub"
-
Uma das personagens que melhor conheceu no meio dos UK Dub soundystems foi o produtor The Rootsman.
.
Realizou com ele algumas das primeiras experiências na área do Dancehall, triturado com Dub, Ragga, Electrónica e Noise.
-
"What I love about him [John Rootsman] is the energy and the fact that he doesn't see the need to reproduce the past, which is an affliction that I feel hampers Reggae in the UK in a very negative way"
-
Em 2001, criam juntos uma editora de 7", a Razor X Productions, "to release Babylonian battle tools, incinerate any dancefloor predators and kill off any party imposters".
.
Vai buscar.
.
.
Cutty Ranks, Daddy Freddy e Warrior Queen integram a lista de colaboradores das produções "Lâmina X".
.
Depois da "homicida" estreia com "Killer" e do ameaçador "raggamafia" dum tal He-Man (nada de confusões com o inimigo de estimação do Skeleton), seguiram-se "WWW" e "Slew Dem", "tostados" pelos igualmente desconhecidos The Mexican e Wayne Lonesome, respectivamente.
.
Por outras não sei quantas palavras, "Killing Sound" é o protótipo do RaggaRRRufff enfiado numa tostadeira até cheirar a queimado e servido com saborosa "bass brutality".
.
Ao fim de 2 anos de cortes com faca bem afiada, reunem tudo o que tinham feito numa compilação publicada pela Rephlex, do então já admirador Richard D. James (Aphex Twin). A compilação levou o título de "Killing Sound" e a ideia era mesmo essa. "Kill Sound"!
.
Kevin diz que o momento mais inesquecível das gravações passou-se com o "errático" Cutty Ranks.
-
"He decided to insult the engineer and provoke the producer on several occasions, whilst getting severely blunted and seriously mashed up on Guiness, before dropping some seriously homicidal lyrics on "Boom Boom Claat"."
-
Pic'aki e aki para matares o som (no 2º tiro, "scrolla" quase até ao fim até encontrares "Killing Sound")
.
.
"Killing Sound" LP - Rephlex 2003
.
Depois destes andamentos com o "Homem das Raízes", Bug continuou sozinho a espalhar "infecções". "Beats, Boms, Bass, Weapons" foi o "explosivo" lançado em 2003 através da austríaca Klein Records (editora dos Sofa Surfers). No mesmo ano, Kid606, cromo in(des)qualificável da Electrónica - Séc. 21, acrescenta um novo ramo à sua árvore Tigerbeat, criando a "sublabel" Shockout para novas aventuras no meio do Ragga, Dancehall, Dub, Jungle e Electro (de preferência, com tudo ao molho ao mesmo tempo). Convidado eleito prá primeira "descarga" da Shockout, Bug okupa o lado B com duas versões "fritadas" dum furioso "Buckle Up", entregue aos "descuidos" vocais de Wayne Lonesome (o lado A é do próprio 606).
.
.
The Bug feat. Wayne Lonesome - "Buckle Up" (12") - Shockout 2003
.
"Pressure", primeiro álbum a solo de Bug na sua reencarnação dance ill, é a confirmação escancarada de que há uma nova corrente d'ar, bem pesada, a "bater" no Dancehall. Chamem-lhe Renegade Ragga. Que ele gosta.
.
O próprio Bug "classificou" o que faz, numa entrevista, como "Electro Ragga to Punk fuelled, Grime flavoured bashment via deep electronic Dub". Vale tudo.
.
Munido de um conjunto de registos vocais distintos, desde o "queimado" do miolo Wayne Lonesome, ao crooner inspirado Paul St. Hilaire, passando ainda pelo poeta metafísico com obra escrita e publicada Roger Robinson, The Bug explorou, as never heard before, a combinação da energia e intensidade do Ragga com uma produção Dub dominada pelo "excesso" de bass, amplificado, "ecoado" e "efeitizado" até à exaustão.
.
Resultado: o disco mais mamado da história do Dancehall / Ragga, sem ser nem uma coisa nem outra.
-
"I want to make music that can be played over a system. Music that I'm not hearing. I go to dub nights, but I'm not hearing Dancehall. I want to hear really rough basslines that aren't particularly Reggae. I want to completely exploit soundsystem to its max"
-
Cagando d'alto nas convenções da música jamaicana, Bug criou um pequeno monstro (de 2,20m de altura), fisicamente bruto, psicologicamente denso e profundo, esteticamente inconformado e socialmente des(cons)trutivo.
.
A (com)pressão de "Pressure" começa com aquele que foi considerado em tempos o mais rápido MC da história, Daddy Freddy, a "desbundar" sobre "Politicians and Paedophiles". É ainda o veterano Daddy quem dá o castigo em "Run the place red".
.
Wayne Lonesome, o desdentado e venenoso "tostador" dos tempos da Razor X, lança um apelo aplicável e implacável aos referidos "políticos e pedófilos": "Fuck Y-Self"!
.
Para temperar o discurso e recuperar o fôlego, Paul St. Hilaire empresta a voz ao conselho em "Live and Learn" (por cima dum Dub electrónico minimalista) e também a "Some Days" e "Living Dub" (em dueto com Roger Robinson).
.
Na linha dum Linton Kwesi Johnson ou Benjamin Zephaniah, Roger Robinson, "encartado" poeta e contador de estórias, com obra exposta em locais tão "importantes" como o Museu de Arte Moderna de Helsínquia ou o Performance Arts Center de New Jersey, declama versos no referido "Living Dub", em "Executor", "Night Steppa" e "Thief of Dreams", este último numa aproximação de Bug ao Dubstep.
.
Há ainda um "Superbird" cantado por um Singing Bird e 2 temas anteriormente lançados em 7": o imbatível "Killer", com Rootsman e He-Man, e o multi-artilhado "Beats, Bombs, Bass, Weapons", com voz de Toastie Taylor.
-
"I am not trying to colonise Jamaican music. I'm simply reshaping it, in my own deformed image. «Pressure» pays tribute to another Jamaican legacy. The sound system DJs of Kingston, such as U-Roy, did more than simply select the records; they improvised wordplay over the top and gave birth to the modern incarnation of the MC"
-
Imaginem que vão levar com uma "pressão" d'ar e acabam a descobrir as diferenças entre Dancehall e Dance ill.
.
Quando estiveres pronto, (com)prime aki.
.
.
The Bug - "Pressure" LP - Rephlex 2003
.
Com os efeitos colaterais de "Pressure" ainda a sentirem-se no ar e em terra, incluindo elogios de "(can)gurus" como Andrew Weatherall ou Aphex Twin, Kevin "The Bug" grava logo a seguir dois EP's, editados também pela Rephlex: "Gun Disease" com Cutty Ranks e "Aktion Pak" com Warrior Queen.
.
O primeiro é um demolidor Electro Ragga Dancehall industrializado a 102 bpm e" baseado no "hit" do próprio Cutty Ranks "Gunman Lyric".
.
O segundo marca o regresso da inimitável Warrior Queen às colaborações com The Bug (quem ainda não conhece esta guerreira, pode encontrá-la aki).
.
Sobe o volume e click'aki (pra um "cheirinho" de "Gun Disease") e aki (pra outro de "Aktion Pak").
.
Bug feat. Cutty Ranks - "Gun Disease" (12") - Rephlex 2003
.
Bug feat. Warrior Queen - "Aktion Pak" (12") - Rephlex 2004
.
A devastação prossegue em 2005 com um novo 12" na Klein Records. "Fire", um "hot chili step" na criação do Dancehall Hardcore, conta com a participação de Ras B, colaborador habitual de Adrian Sherwood na On-U Sound, e que também já o foi dos ADF e de Dennis Bovell.
.
Com um extintor numa mão, carrega com a outra aki e ouve. Mais fogo? Mais fogo!
.
.
The Bug feat. Ras B - "Fire" (12") - Klein Records 2005
.
Intensidade, espaço, densidade e atmosfera são aspectos que não passam despercebidos a K-Mart (outro dos pseudónimos de Kevin Martin).
-
"I'm really drawn to intense forms of music. Extreme forms of music. It doesn't have to be extremely loud. It can be extremely quiet. Anything that wakes you up and jogs you out of the tedious boredom of daytime radio"
-
Martin é definitivamente um homem com muitos rostos (musicais). No final de 2005, cria uma nova personagem no universo Grime/Dubstep. Pressure (a personagem, e não o disco) apresenta-se com Warrior Queen num adocicado "Money Honey". Cortesia da Hyperdub para ouvir aki.
.
.
Pressure feat. Warrior Queen - "Money Honey" (12") - Hyperdub 2006
.
Mas como a hiperactivade parece não ter limites neste gajo, em 2006 inicia mais um novo projecto, Ladybug, destinado exclusivamente a produções com vozes femininas.
.
Warrior Queen será a primeira das "ladybugs" com "Dem a bomb we", um "mural" da história sobre as explosões de 7/7 /2005, em Londres. No lado B, Bug dá largas à imaginação com a brasileira Deize Tigrana, surpreendente e "de peito feito" num baile funk da favela, "(as)sexuadamente" chamado "Miniatura de Lulu". A "Danada Tigreize" diz a um macho que "seu lulu é tão piqueno, qui não roça nem nas coxa"!!! Sem comentários. Roç'aki .
.
Ladybug feat. Warrior Queen - "Dem a bomb we" (12") - Soul Jazz 2006
.
Envolvido actualmente na produção de 4 álbuns em simultâneo (o 2º em nome de Bug, com edição assegurada pela Ninja Tune, o primeiro como Ladybug, um outro com King Midas Sound e uma colaboração no de Warrior Queen), Kevin arranja ainda tempo para passar música e gerir com Loefah (dos dubsteppers DMZ), as noites "BASH" em Shoreditch (Londres), sinónimo de "b(ad)ass soundclash".
-
"We're trying to break down barriers between genres and draw a line through Dubstep, Grime, Dancehall and Hip Hop"
-
Se um dia alguém ouvir falar em Noisy Dancehall ou Dancehall Hardcore, já sabem quem é o pai da "besta".
.
Para ajudar a sentir a "pressão" experimentem um vídeo, gravado em Setembro do ano passado em Lausanne (Suiça), com MC por identificar, aki.
.
Para visitar uma página do Myspace cheia de Bug, siga por aki.
.
Este "post it" serviu-se descaradamente de partes de entrevistas encontradas por aí.
.
(des)Infecta-te!